quinta-feira, 29 de outubro de 2009



ILUMINADA

A lua me abandonou
Esqueceu-se de meus versos.
Porque estás tão triste,
Tão longe de mim?
Resolves-te simplesmente
Casar-se com mercúrio,
O planeta rubro amante?
(Quente e vermelho de ciúmes do poeta ardente)
Saturno carregará sua aliança,
Deixando o poeta sem nenhuma esperança?
Torna a clarear meus versos
Lua constante.
Torna a iluminar a escrita,
Vê se deixa seu amante um segundo,
Olha para cá,
Para esse poeta vagabundo.
Sei que lua é mulher
Que tem lá suas mil fazes
(não faces)
Em cada mês corrente,
Mas não se estresse com nada
Oh lua iluminada,
Pois os versos dessa embolada
Te trarão de volta
Após cada nova alvorada.
O poeta se apaixona todo dia
Pelas curvas que a lua irradia.
Vem, pára de iluminar apenas o sertão,
Vem correndo beijar-me por inteiro
E preencher seu espaço
Ainda vazio em meu coração.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009



FALAR POR FALAR

Em tempo escandaloso
Não agüento mais
O peso das horas
De conversa jogada fora
Sem razão, sem contexto
Sem sentido.
As palavras saem da boca
Com sons que não escuto
Em frases que não entendo
E nem me faço querer entender.
Porque falar tanto,
Se é no pensamento
Que a vida se engrena?
(ou se engana.)
Exprimir-se a esmo é
Aspereza na garganta
E frouxidão do cérebro.
E como tem gente que fala
Nesse pobre mundo,
Casulo de Helenas e
Raimundos!
A voz é a embriagues sonora
Em ouvidos desacostumados,
É bebedeira em copo vazio,
É sentar-se em cadeira quebrada
De botequim empoeirado.
A voz é estrondo,
Estupro
Da alma calma do silêncio
É duelo de armas diferentes:
Covardia.
O mundo deveria ser só silêncio
Talvez cortado suavemente
Por canto de pássaros
Ou música que
Apenas a natureza tocasse!
O mundo podia resumir-se
Em pensamentos,
Se assim fosse,
O deslumbre ao ler tais versos
Causaria uma explosão de silêncio
Gracioso e doce
Em cada alma
Que um dia o escutasse
Num sussurro vindo do vento
Ecoado no espaço.
Voa verso fino
Voa para os ouvidos
Dos falantes
Torna-os apenas ouvintes,
Amantes
Do sossego
E de versos
Cheios de tons
E requinte.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009



EU, SER DICIONÁRIO

Pendência
O conflito de idéias e redação;
Redenção
Libertação da escravidão do pecado;
Pecado
Entre o capital e o original;
Brio
A valentia do fogo sagitariano;
Interjeição
Em grito mudo de todos os sentimentos;
Locução
Roteiro de uma vida fragmentada;
Válvula
De controlar fluxos de idéias;
Pensamento
Fantasia do sonho e da imaginação;
Intelectual
Inclinação por coisas do espírito, da inteligência;
Espírito
O ridículo divertimento cômico do humor;
Idiota
Que sofre de idiotia tola acumulada;
Amor
Cupido míope de flecha sem mira;
Malícia
Não adquirida ao nascer e caminhar;
Brejeiro
Naturalmente brincalhão e vagabundo;
Safado
Gasto e deteriorado pelo uso;
Expectativa
Sem qualquer probabilidade e com todas as promessas;
Corpo
Parte principal de um livro sem relato;
Livro
Obra alfabeticamente viva, sem volume;
Constituição
Características funcionais, anatômicas e psíquicas
De um ser chamado dicionário
Involuntário
À vontade de ser lido, aberto e entendido;
Findo
Passado, acabado, concluído.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009



ÚLTIMA HORA ANTES DE NASCER

Noite grande
Dia longo
“Passo a madrugada procurando um raio de luz”
Ah... dia que não passa
Ah... noite acordada
Mostra-me logo essa alvorada!
Vivo em madrugada
Semente do dia
Pó da noite
Aurora
Minha amante de cor
Com todo seu açoite
Felicidade azul
Morro e vivo em ti
Extremidade e antecipação
Alvor sem pudor
Claridade sem lealdade
Principio da alma.
Vivo em ti
Alvorada amada
Arraiada
Morte do tenebroso
Genitora do luminoso
Casa salva de minha alma
Embriago-me em teu clarão
Esqueço-me da noite
E entro para o dia,
Ainda hesitante,
Saudoso e apaixonado
Pela lembrança
De minha alva amante.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009



TÍTULO EM AZUL


Não sou insensível,
sou inquieto,
nas qualidades
tenho o amor
que torna tudo
em dor.
Aplausos,
fomos sorteados
ganharemos a felicidade
que virá a prazo,
nada mais de dor,
De agora
até o próximo mês
chegará a nossa vez.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009



ASSIM NASCE

O desejo é limite do olhar
O olhar é limite do beijo
O beijo é limite do coito
O coito é limite do esperma
O esperma é limite da célula
A célula é limite do osso
O osso é limite da carne
A carne é limite da alma
A alma é limite da noite
A noite é limite do dia
O dia é limite da idade
A idade é limite do álcool
O álcool é limite do sonho
O sonho é limite da vida
A vida é limite da morte
A morte é limite do desejo.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009




PREVISÃO EM TEMPO

A chuva me rondou o dia todo
Circulava...circulava
O vento passava correndo
Os raios chamavam os trovões
E a chuva só
Só ela
Somente ela não chegava
Circulava...circulava
Fingia
Fugia
Me irritei.
Ô chuva, vê se cai
E para de milonga
Molha logo esse chão
Lava logo essa alma
Leva agora a podridão
Para bem longe...
Pro fundo do mar!
A chuva tem seus ouvidos
E querenças
Até parece que é da nona constelação,
Só cai quando quer, se quer cai
E agora às 23:21
To de alma lavada
Vendo a podridão
Se afogar na enxurrada
A caminho do mar.



DESENCONTRO.

Nuvens
São como pensamentos,
Cada vento
Uma nova forma de sofrimento.

Forma muda.
Muda o pensamento,
Muda o ar,
Mas não a forma de amar.

O ar que muda as nuvens
Roda sem parar
A procura de nova nuvem
Na esperança de amar.

O amor que o vento refresca
Na forma de olhar,
No jeito de andar,
No sorriso a beijar,
Nunca pára de sonhar.

O amor que move o vento
Esse vento besta a procurar
Em quem encostar
Para lhe ensinar a amar.

Amor que não se ensina
Vento que não procura
Coincidência...
O amor e o vento
São felizes por não se encontrar.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009



CLAMOR

Um grito de encontrar
Sem de fato procurar!

Perambulando deparo
Com fruto mundo obscuro,
Tomo um pouco de ar
Vejo o céu, enxergo.
Olho os pássaros, vejo.
O sol está nublado, mas está no seu lugar.

Vou de encontro ao rio
Que deixa sua água passar,
Passando,
Sem desperdício, cortando a terra
À procura do mar.

Ah nuvem, de onde veio?
Como se formou tão densa?
Onde sua lágrima vai soltar?

O rio é lágrima de nuvem.
O céu é rio de nuvem.
A nuvem é estrada de pássaros.
O sol é lâmpada lunar.

Como viver essa vida
Que corre como um rio,
Que voa como o pássaro,
Que é densa como a nuvem,
Que se transforma como o sol?

O grito é o remédio do dia
O dia é a solução da vida
A vida é fonte de nuvem.

Aqui perdido,
Deixo minha vida!
Que o rio a leve,
A transforme em nuvem,
A aqueça de sol,
E a dissemine como lágrima.

Vai vida
Parta como o grito, à viva força.
Liberte-se no ar, como os pássaros.
Se encontre no universo, sem se procurar.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009



SOBRE VIVER

Sobrevivendo a mim
Vago e pausado eu
Vogo em meus conflitos
E naufrago nos sentimentos.
Eu, os versos de Tabacaria
Em Pessoa
Vivendo no Fado Tropical
Assim agora creio
Cri
Crerei.
Meus livros me prendem
Meus versos me esmagam
Minha razão me julga
Ainda assim
Sobrevivo a mim.
Eu, repleto de dores
Sofrimento moral
Administro meu doping
Intoxico-me de mim.
Casto
Para não transmitir gene
Dizimando futuras proles
De futuros eus
De futuros sobreviventes
De mim.
Minhas palavras cortam
Minhas atitudes aniquilam
Meu peso me drena
Ainda assim
Sobrevivo a mim.
No copo me analiso
Clinico cínico que não me da alta,
Tropeço nas dúvidas profundas
Se continuarei
Sobrevivendo sempre assim
Além de mim.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009






Pior que estar sozinho é sentir-se só.
Sempre à espera de algo, nem sempre de companhia.
Espera-se o nascer do sol, a brisa do vento,
Qualquer que seja o momento.
O espaço fica cada vez mais apertado
Os cômodos menores
Os passos são contados
As paredes não saem da frente
Portas imprudentes.
Os enfeites, em cima dos móveis, parecem oponentes de maratona
Para todo lugar que se olha, lá estão, indiferentes.
Pode tentar se livrar: mas solidão é companhia
Pode sair na carreira, virar nunca para o mesmo lado,
Com euforia olhar para trás - alegria!
Despistou a sorrateira,
Por um instante se acha livre,
Mas logo percebe que ex-liberto está
A senhora não lhe dá ventre livre – sofre calado.
Escravo de uma senhora invisível
Preso no tempo, acorrentado ao espaço.
A fuga sempre a elaborar
Cavando o próprio túmulo intransponível
Na esperança de sozinho nunca mais ficar.