A TELA DE TODOS
Tenho vontade de pintar. Sinto que posso criar coisas
incríveis, minha imaginação imagina que posso romper qualquer
barreira, as cores se misturam em minha mente, meu daltonismo se
cura, a combinação de cor pare nova cor. O quadro está diante de
mim, pronto já tenho milhares, terminado não tenho nenhum, também
quadro não se termina, sempre fica a acabar, assim são minhas
idéias, minhas vontades, meus desejos. Tenho que um dia pegar no
pincel, esquecer tudo, o medo, a insegurança e começar a traçar a
primeira linha, torta que seja, mas que se mostre decidida e
contínua. Fujo então do quadro mental para desenhar a vida
material, que como a tela não terá fim, apenas um começo, um
meio... enfim...
Fico
pensando como seria bom sujar as mãos de tinta, colorir os calos
doloridos, errar com facilidade, pintar por cima, mudar a paisagem.
Facilidade, é a chave de qualquer felicidade, de qualquer momento de
criação, facilite, feche os olhos, se veja fazendo, faça! Olho
para minha mão toda colorida, sinto a frieza da tinha, o cheiro de
química, o enrugar da pele ao secar do acrílico. Como é bom deixar
de sonhar e começar a pintar.
O
pano já tem fundo, formas tridimensionais, erros propositais, cores
berrantes, manchas errantes, cada hora num tom tornam-se parte da
figura, murmuro: então assim é a vida!
Cada
certo se borra um errado? Se na vida acertarmos a metade e errarmos
na mesma proporção o quadro ainda será belo, com manchas
itinerantes, mas ainda será lindo. A moldura que não deve ser
colocada, deixe que tenha forma própria a bela tela da linda vida.
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